pedra pão
vidro fogo
sombra luz
vida vida
fotografia de José Figueira
olhaste por cima do ombro
e adivinhaste os nomes nas cadeiras,
na hora em que o sangue se torna mais rápido
e interrompe a linha que preenche o tempo.
é a hora.
esqueces a pele das palavras
e toda a vulgaridade da linguagem
como a tela suja que sacode o orvalho
para debaixo dos pés.
música vozes aplausos
respiração suspensa,
gritos mudos,
suspiros vozeados,
aplausos
assobios
aplausos
embalados pela vida que inaugura instantes,
os mesmos que esquecem
o frio da cama
o colchão sem molas
a frieza do chicote
ou a itinerância dos passos.
a ilusão
[não dessa que os poetas gastam nos seus versos,
mas da outra,
da verdadeira,
da que transforma o chão de vidros e ácido
em leite e pão],
a ilusão é sonâmbula.
são duas horas
um tempo que o relógio não contou
um tempo suspenso
um tempo em que o mundo girou em torno das tuas mãos,
nesse erguer de pernas
naquele vómito de fogo
no salto acrobático sem rede,
por entre respirações incompletas
arremessos de risos
e disparos de gargalhadas.
são duas horas
que apagam a casa movediça
e escalam precipícios com as pontas dos dedos
enquanto a cabeça estoura entre os dentes das feras.
Texto publicado na rubrica Amigo Oculto, no blogue Trem da Lira (http://tremdalira.blogspot.com/), da Cris de Souza, em 23 de dezembro de 2011, sob o pseudónimo Eurico Portugal.
marillion, out of this world